

- Author, Anna O’Neill
- Role, BBC News
- Reporting from London
Aviso: Esta reportagem contém imagens e conteúdos que podem ser perturbadores para alguns leitores
Quando Annie Makeeva saiu de Londres para uma viagem solo ao Vietnã em dezembro de 2022, ela nunca imaginou que seria agredida sexualmente por dois “incels” – homens que culpam mulheres por não conseguirem encontrar parceiras sexuais.
Aconteceu no primeiro dia de férias, depois que Annie pedalou 10 km até um parque remoto no sul do país, o Cat Tien National Park.
“Eu decidi pedalar pela trilha da floresta e depois caminhar até o Crocodile Lake, que é a atração principal. Parei no fim da trilha e vi dois homens lá, que eu imaginei que eram turistas”.
Mas, minutos depois, os homens seguiram Annie pela floresta e a atacaram.
‘Eu comecei a gritar, mas percebi que ninguém ia conseguir me ouvir’

Crédito, Annie Makeeva
“Assim que eles passaram por mim, o primeiro homem me agarrou. Ele disse algo em vietnamita para o amigo dele, que estava do meu outro lado. Eu olhei para ver se esse amigo estava vindo me ajudar ou se ele também iria me atacar. No fim das contas, ele também queria me atacar”, conta.
“Eles começaram a passar a mão em mim. Eu gritei por ajuda, mas percebi que ninguém ia conseguir me ouvir”.
Annie, que é do oeste de Londres, afirma ter ficado muito assustada quando os homens a imobilizaram para tentar jogá-la no chão. Mas ela conseguiu se soltar e se esconder atrás de uma árvore.
Um dos homens a agarrou novamente e olhou para o amigo por um instante. Annie aproveitou a situação e deu um soco forte na nuca dele, deixando-o desorientado.

Crédito, Annie Makeeva
Neste momento, a turista britânica pegou o celular para tirar uma foto dos homens, o que fez com que um deles lhe oferecesse dinheiro para que ela ficasse quieta.
Quando Annie recusou o dinheiro, a situação mudou. Os homens começaram a se afastar, fugindo pelo caminho por onde tinham vindo.
Annie então teve que decidir se iria na mesma direção que os homens até onde ela havia deixado sua bicicleta, e pedalaria 10 km de volta ao hotel, ou se ela seguiria por 5km até um ponto onde ela sabia que encontraria um guarda florestal e, possivelmente, outros turistas para ajudá-la. Ela optou pela segunda opção.

Crédito, Annie Makeeva
A BBC viu uma foto dos machucados na parte superior do corpo de Annie. Ela não quis que essa imagem fosse usada na reportagem.
Os homens que atacaram Annie foram detidos pela polícia no mesmo hotel onde ela estava hospedada. A britânica disse que os policiais consideraram o ataque como algo “espontâneo”, e não planejado, e que não sabiam o tipo de punição que os homens receberiam, se é que receberiam alguma.
Annie entrou em contato com o Ministério das Relações Exteriores do Reino Unido no dia seguinte. Um porta-voz informou à BBC: “Nós prestamos apoio à cidadã britânica no Vietnã e entramos em contato com as autoridades locais”.

Crédito, Annie Makeeva

Crédito, Annie Makeeva
Com dificuldade para lidar com o que aconteceu, Annie decidiu investigar se os homens já haviam feito isso antes.
Ela foi incentivada a tirar uma foto dos documentos de identidade dos homens que haviam sido confiscados no hotel. Quando retornou ao Reino Unido, ela usou a informação para procurar os perfis nas redes sociais.
Mas o que Annie encontrou, a deixou horrorizada.
“Está cheio de imagens violentas. [O conteúdo] é extremamente misógino, e promove a violência contra as mulheres, especificamente contra turistas ocidentais.”
“Há fotos de armas – incluindo armas caseiras -, de práticas de tiro. Eles descrevem as mulheres como “prostitutas” e as comparam com animais que devem ser domesticados. E mantêm registro das mulheres que eles atacaram. Eles se vangloriam dos ataques e zombam de nós. É assustador.”
‘Uma câmara de eco da violência contra mulheres’

Crédito, Annie Makeeva

Crédito, Annie Makeeva

Crédito, Annie Makeeva
O perfil na rede social de um dos homens mostra uma imagem de uma mulher sem roupas sendo decapitada e as palavras “o futuro das mulheres”. O perfil do outro homem é cheio de vídeos obscenos dele se masturbando com pornografia.
“Eles são incels. Postaram nas redes sociais explicando que eles não conseguiram encontrar alguém para namorar, para ter relações. Eles criaram essa câmara de eco de violência contra mulheres”.
“Foi muito difícil para mim voltar à minha vida normal. Eu parei de fazer trilhas. Não gostava de sair de casa à noite ou em qualquer horário”, conta Annie, segurando o choro.
“Eu me tornei hipervigilante e isso é exaustivo. Será que eu posso atravessar o parque e ir para a aula de yoga? Quem está atrás de mim no metrô? Eu posso confiar em um colega que entra no elevador comigo?”.
Doze ataques
Annie, que trabalha como tradutora, diz que quer conscientizar as pessoas sobre a violência masculina contra mulheres.
“Também quero proteger qualquer mulher que esteja pensando em viajar para aquela região, em qualquer momento.”
E acrescenta: “Pode haver outras mulheres que foram atacadas e não sabem por quem ou por quê”.

A BBC entrou em contato com a polícia vietnamita e com os próprios agressores, por meio das redes sociais. Não houve nenhuma resposta.
Annie tem certeza de que existem mais vítimas – algo evidente pelas postagens dos homens nas redes sociais.
“No total, foram oito ataques contra turistas ocidentais, três contra mulheres locais e um contra uma turista chinesa”, diz Annie.
“Eu sei que há outras vítimas por aí. De certa forma, eu me sinto extremamente sortuda porque o que aconteceu comigo poderia ter sido muito pior”.
- Se você foi afetado por qualquer um dos temas abordados por nesta reportagem, pode encontrar ajuda e apoio por meio da BBC Action Line here.
Fonte: BBC