
A Capela dos Aflitos, de 1775, uma das mais antigas de São Paulo, será finalmente reformada. O bairro da Liberdade, onde ela está localizada ganhará também o Memorial dos Aflitos, que vai contar a história de pessoas negras que viveram e morreram por ali, nos séculos 18 e 19, quando a região foi uma das primeiras moradas de pessoas negras na cidade e abrigou o cemitério dos aflitos, dedicado a negros e indígenas.
As boas notícias foram confirmadas pelo Secretário de Cultura de São Paulo, Totó Parente, na semana passada (9/4), quando visitou a capela e disse que a obra deverá terminar em até um ano. A promessa, que muitos temem não se cumprir, é o compromisso que os movimentos sociais lutavam para que o poder público assumisse, com uma das regiões mais importantes para a memória negra na cidade e que foi por anos escanteada e apagada da história oficial.
A Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa liberou R$ 1 milhão para à Mitra Arquidiocesana de São Paulo, que administra a capela. A verba também será destinada para requalificação urbanística da Rua dos Aflitos. “A via será transformada em espaço cultural, integrando história, memória e vivência artística no território”, informa o órgão.
A verba anunciada pela prefeitura vai complementar os R$ 2,5 milhões conquistados pela União dos Amigos da Capelas dos Aflitos (Unamca), por meio de edital do Proac, da Secretaria de Cultura, Economia e Indústria Criativas do Governo de São Paulo (SCEIC) e o Ministério da Cultura.
A estátua de Francisco José Chagas, o Chaguinhas, cabo negro condenado à forca após liderar uma revolta por não receber salários no século 19, que foi prometida em 2023 e deveria ter sido realizada em 2024, não foi mencionada no projeto. Importante lembrar que Chaguinhas resistiu a três tentativas de enforcamento, nas quais a corda arrebentou, e acabou sendo morto a pauladas na frente das pessoas que assistiam à sua execução em 20 de setembro de 1821.
Ele acabou se tornando um santo popular, uma vez que as pessoas vão até a capela pedir milagres, depositando papéis na porta de madeira e batendo três vezes na mesma para alcançar o pedido. O rito se tornou patrimônio imaterial do Estado de São Paulo em 2024, a partir de lei proposta pela deputada estadual Leci Brandão (PCdoB).
A Unamca afirma que recebeu a notícia com “alívio”, pois a grana vai garantir que a capela seja integralmente restaurada. “Foram sete anos de luta para a conquista deste momento histórico para a populações negra e indígenas, bem como para a garantia dos direitos fundamentais à memória e à verdade da escravidão”, afirma Lucas Almeida, integrante da Unamca, responsável pelo edital aprovado. Ele lembra também que o Cemitério dos Aflitos é “um local dos mortos e desaparecidos da escravidão e do tráfico transatlântico”.
Uma memória importante de ser resgatada e que todo mundo que visita o bairro da Liberdade precisa conhecer. Por hoje, comemoramos, mas continuamos vigilantes para que as promessas realmente saíam do papel e retratem de fato a memória e história negra soterrada no bairro que já foi conhecido apenas como japonês. A história negra resiste!
Fonte: Folha de S.Paulo