
É um escândalo que repercute menos do que deveria, entre a “cleptoteocracia” do MEC e a compra de Viagra para militares: o esquema de fake news atribuído ao iFood para desmobilizar uma greve de entregadores em 2020.
De todas as falcatruas dos anos mais recentes, essa é a que mais afeta nossas vidas comezinhas, nosso cotidiano. “Ah, mas e as fake News das eleições?” São a mesma coisa.
Primeiro, um brevíssimo resumo da história. Uma reportagem investigativa da Agência Pública descobriu um esquema envolvendo o iFood e agências de publicidade para desacreditar as lideranças dos entregadores de comida –que reivindicam remuneração justa e segurança para trabalhar.
A ação dos publicitários se dava principalmente nas redes sociais, com perfis falsos que se passavam por “motocas” insatisfeitos com o “breque”. Ou seja, a paralização dos profissionais de entrega em protesto contra as condições precárias de trabalho.
Foi criado um perfil fake no Facebook, chamado “Não Breca Meu Trampo”, em que os publicitários simulavam a linguagem dos entregadores para rebater, como se fossem motocas, os ataques ao iFood. Um espetáculo de vergonha alheia, olhando agora. Mas não é apenas isso, é uma coisa perversa demais.
A Folha recuperou a história e acompanhou, por exemplo, a diligência da CPI dos Apps, da Câmara Municipal paulistana, na sede do iFood em Osasco. Ainda assim, o assunto não decolou. Pena. É uma coisa muito grave, e o iFood nem é a pior parte disso.
Que o iFood queira botar água na fervura dos grevistas é compreensível, apesar de decididamente sórdido.
O que me assombra é a atuação de profissionais de comunicação, que devem ter tido lá suas aulas de ética na faculdade, a espalhar mentira e desinformação de forma tão natural.
Meu palpite é que foi descoberta só a chave que abre a Caixa de Pandora. Se está rolando com o iFood, tem cara de ser prática já disseminada em todos os setores. Publicitários se passando por gente sem vínculo com a empresa interessada para influenciar consumidores insidiosamente.
Você reclama da passagem aérea cara no Twitter, aí vem alguém sem foto, sem nome, sem seguidores e com a arroba @eifhjweifo321414 dizer que você está atrás de likes ao expor um caso excepcional. Como não desconfiar desse perfil?
Vale com tática de guerra suja para operadoras de celular, fornecedoras de internet, planos de saúde, qualquer tipo de serviço. É um know-how que publicitários e marqueteiros desenvolveram para campanhas políticas e agora aplicam no mundo corporativo.
Nas redes sociais, muitas vezes você não sabe com quem interage. Esses fakes atuam para mitigar o estrago de postagens negativas entre os seguidores do seu perfil e, mais do que isso, vigiam a sua atuação nas redes sem serem detectados.
É o inferno.
Meu conselho para as redes sociais: bloqueie qualquer seguidor que não tenha um rosto ou carregue um nome cheio de números.
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Fonte: Folha de S.Paulo