
Chegou aquela época do ano em que calouros das faculdades de elite disputam os cruzamentos dos bairros nobres de SP com vendedores de bala, malabaristas e pedintes ordinários.
No sinal fechado, o motorista é abordado por garotas e garotos majoritariamente brancos, geralmente bêbados, suados, fedorentos, encardidos e emporcalhados de tinta e farinha –mas que preservam a beleza sedutora da juventude bem-alimentada, com todos os dentes na boca.
Dá para entender por que o tiozão da Land Rover, hoje um respeitado cirurgião, saca uma onça pintada da carteira e a entrega no pedágio dos estudantes de medicina. Ele se projeta naquela garotada que ainda tem o melhor da vida pela frente.
Dá para entender, mas é difícil aceitar. Patrocinar a cervejada dos filhinhos-de-papai me parece algo meio indecente. Especialmente num lugar como o Brasil.
Isto não é um surto moralista contra o consumo de álcool na juventude.
Cada pai que cuide de seu filho. Eu não vou pagar de fiscal da prole alheia quando meninos e meninas –entre os 16 e os 20 e poucos anos– recolhem dinheiro para encher a cara depois. Pode ser até que algo da grana arrecadada seja convertido em mistos e baurus. Ainda assim, não alimente os calouros.
“Ain, mas e na sua época?” Fiz pedágio e bebi cada centavo. Agora, se tem uma coisa boa em envelhecer, ela é: ser menos cretino do que a sua versão jovem. Um pouco menos, que seja.
Tampouco venho bradar contra a crueldade do trote universitário. No caso específico do pedágio, cada um dos moleques está absolutamente eufórico por participar da brincadeira. E com razão. O cara ralou feito um monstro e superou obstáculos que assombram o sono de todo aluno do ensino médio. Essa garotada merece fazer festa.
Mas não com o meu dinheiro.
É muito fácil ter empatia com alguém que se assemelha a você mesmo antes dos tombos e das rugas. Quero ver ter empatia com o cracudo, com o lazarento, com o esquizofrênico que dorme sob a marquise.
Não que esmola vá resolver algo para essa gente miserável, porém… a concorrência dos estudantes lindos é desleal. No frigir dos ovos, eles estão roubando os trocados do lumpesinato.
Se você não alimentar os calouros, eles vão tomar cerveja do mesmíssimo jeito. Papai não deixa o filhote passar fome nem sede, pode ter certeza.
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Fonte: Folha de S.Paulo